Morre Luiz Werneck Vianna deixando órfã uma geração de cientistas sociais.
Aluno de Ciências Sociais no IFCS, entre 1964 e 1967, Werneck nos ensinou a grandeza e o sentido deste curso do qual tenho a honra de ser professora. Seu pensamento, de natureza holística na consideração dos fenômenos sociais, indissociáveis nas suas dimensões antropológica, sociológica e política, mas, sobretudo histórica, nos alerta para o risco de interpretações compartimentadas, especializadas e alienantes, posto que resultam em reflexões anódinas e inodoras sobre uma pequena parte, enquanto o todo, confuso e doloroso segue rejeitado. Este todo é o Brasil e Werneck nos ensinou a pensá-lo.
Nos idos de 2008, ensinou uma menina de 20 poucos anos a ler em uma semana 1000 páginas de Oliveira Vianna, Tavares Bastos, Alberto Torres, Francisco Campos entre outros. Me ensinou a esperar suas pausas, seus silêncios. Me ensinou que os grandes autores são grandes por alguma razão e que precisamos ter a humildade de lê-los e mergulhar em seus textos.
Como intelectual público e professor, Werneck nos ensinou que toda reflexão é engajada. Fez isso de maneira arriscada. Diante da hegemonia de leituras acerca de nossa sociabilidade insociável e deletéria, Werneck dobra a aposta sobre a sociedade civil. E, em um contexto marcado pelo autoritarismo, defende na USP, na década de 1970, uma tese de doutorado intitulada Liberalismo e Sindicato no Brasil, apontando um caminho que muitos anos depois faria todo sentido para mim: o sindicalismo.
A despeito dessa incursão na academia paulista, ao meu ver, o pensamento de Werneck estabelece nossa marca, enquanto intelectuais cariocas. Aqui, nesse balneário de burocratas e funcionários públicos, onde o mercado e o liberalismo são ficções nebulosas, americanismo e iberismo, via prussiana e revolução passiva tornam-se ainda mais prementes como chaves de leitura.
Atuando no antigo IUPERJ e na Escola de Magistratura do Rio de Janeiro, Werneck organizou nessas chaves o pensamento de gerações de sociólogos, antropólogos, cientistas políticos e operadores do direito. Meu pesar recai sobre as próximas gerações, sobre os meus alunos, que não terão o privilégio de ouvir sua voz e seus silêncios em sala de aula.
Oxalá estejamos à altura do desafio de seguir interpretando este doloroso Brasil sem ele.
Mayra Goulart – Professora do IFCS, cientista social e, atualmente, presidente da ADUFRJ (Seção Sindical dos Docentes da UFRJ).